"...Política não se faz com ódio, pois não é função hepática. É filha da consciência, irmã do caráter, hóspede do coração. Eventualmente, pode até ser açoitada pela mesma cólera com que Jesus Cristo, o político da Paz e da Justiça, expulsou os vendilhões do Templo. Nunca com a raiva dos invejosos, maledicentes, frustrados ou ressentidos. Sejamos fiéis ao evangelho de Santo Agostinho: ódio ao pecado, amor ao pecador. Quem não se interessa pela política, não se interessa pela vida..."
A CONSTITUIÇÃO CIDADÃ
"O povo nos mandou fazer a Constituição, não ter medo"
A CONSTITUIÇÃO CIDADÃ
"O povo nos mandou fazer a Constituição, não ter medo"
*Deputado Ulysses Guimarães Presidente da Assembléia Nacional Constituinte
Quando iniciamos a votação do segundo turno do Projeto da futura Constituição, testemunho o trabalho competente e responsável dos constituintes nas subcomissões, comissões temáticas, comissão de sistematização e no plenário. São os tecelões do tecido constitucional. 39.000 emendas estudadas e apresentadas documentam esse extraordinário esforço e o empenho posto pelos constituintes em contribuir conscienciosamente para a qualidade do texto.
Foi longa a travessia de dezoito meses.
Cerca de 5.400.000 pessoas livremente ingressaram no edifício do Congresso Nacional. Quem leva, sem discriminação, contribuição ou crítica a fazer, pode ou pôde, tempestivamente, fazê-lo. As portas estavam e continuam abertas. É só transpô-las.
A Constituinte teve o foro de multidões.
Saúdo o relator Bernardo Cabral, que confirmou seu renome de jurista e sua espartana dedicação, coadjuvado pelos relatores adjuntos Konder Reis, José Fogaça e Adolfo Oliveira, também dignos de reconhecidos encômios, bem como os eficientes membros da mesa.
Sem a compreensão e o talento dos líderes partidários não chegaríamos à fase atual de nossos trabalhos. Os funcionários, representados pelo Secretário-Geral da Mesa, Dr. Paulo Affonso Martins de Oliveira, e pelo Diretor-Geral, Dr. Adelmar Silveira Sabino, bem como a imprensa, rádio e televisão com justiça integrarão este evento histórico.
O Projeto submetido a segundo turno é longo - 321 artigos - versando matéria complexa e tantas vezes controvertida.
Inevitavelmente abriga imperfeições, previstas pela instituição de um segundo turno revisionista e pelo avultado número de emendas e destaques apresentados.
Existem imprecisões, reconheço. Vamos corrigi-las, estou certo.
Mas, mesmo na fase atual, o projeto tem muito mais do que nos orgulharmos do que nos arrependermos. Impõe-se mais defendê-lo do que reformá-lo.
Assinale-se sua coragem em inovar, a começar pela arquitetura original de sua confecção, rompendo padrões valetudinários e enfrentando a rotina do "status quo".
Dissemos NÃO ao stablishment, encarnado no velho do restelo, conclamando, na praia alvoroçada da partida, Vasco da Gama, Pedro Álvares Cabral e Camões a permanecerem em casa, saboreando bacalhau e caldo verde, ao invés da aventura das Índias, do Brasil e dos Lusíadas, e amaldiçoando "O Primeiro que, no mundo, nas ondas velas quis em seco lenho".
Esta constituição terá cheiro de amanhã, não de mofo.
Para não me alongar, reporto-me a alguns aspectos, que reputo inaugurais, do texto ora submetido ao crivo da revisão constituinte.
A soberania popular, sem intermediação, poderá decidir seus destinos. Os cidadãos apresentarão proposta de lei, portanto terão a iniciativa congressual, e também poderão rejeitar projetos aprovados pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal. Portanto, os cidadãos propõem e vetam. São legisladores, exercitam a democracia direta.
Poucas constituições no mundo democrático têm essa presença direta e atuante da sociedade na elaboração dos preceitos de império em seu ordenamento jurídico. O Brasil será, assim, uma república representativa e participativa. Teremos a convivência e a fiscalização de mandante e mandatários a serviço da sociedade.
Após quase 500 anos, o Projeto redime a geografia do Brasil.
Nossa geografia é violentada pela concentração nacional de rendas e de competência. Nossa geografia é regional, é local, é municipal, com municípios maiores do que muitos países.
As urnas dão votos para os governadores e prefeitos administrarem. Mas só a autêntica Federação, que estamos organizando, dá o dinheiro para que tais governos dêem respostas às necessidades localizadas.
Federação é governo junto com o homem. Não homem correndo atrás do Governo Estadual ou de Brasília, freqüentemente longínquo e indiferente.
Esta alforria, do homem e de seus governantes, foi decretada pela transferência de 47% dos recursos da União para os Estados e Municípios, 21,05% àqueles e 22,5% para estes.
Se não tivéssemos feito mais nada, só com isso teríamos feito muito.
Cooperamos para reversão da instável e irracional pirâmide social brasileira de 130 milhões de brasileiros carentes na base projetada para o ar e apoiada em seu vértice em Brasília, onde estão os recursos.
Com os hodiernos conceitos de seguridade, estamos, entre os este países que a adotam, instituindo a universalidade dos beneficiários, mesmo aos que comprovadamente não possam contribuir. Desobstruiu-se o acesso à Previdência, sem desequilíbrio, às donas-de-casa, arrendatários e pescadores.
Diminuiu-se pela equivalência a separação entre o trabalhador rural, com oito benefícios, e o urbano, com trinta e dois.
Governar é encurtar distâncias. Governar é administrar pressões, e as pressões primárias e diretas são as do lugar onde se vive, trabalha, estuda, sofre e ama.
Quanto aos onze milhões de aposentados, foi-lhes garantido o valor real dos proventos através do tempo, para que não sejam destroçados pela inflação, como hoje ocorre, ocasionando a humilhação, o desespero e a morte.
Senhoras e Senhores Constituintes.
A Constituição, com as correções que faremos, será a guardiã da governabilidade.
A governabilidade está no social. A fome, a miséria, a ignorância, a doença inassistida são ingovernáveis.
Governabilidade é abjurar o quanto antes uma carta constitucional amaldiçoada pela democracia e jurar uma constituição fruto da democracia e da parceria social.
A injustiça social é a negação e a condenação do governo.
A boca dos constituintes de 1987-1988 soprou o hálito oxigenado da governabilidade pela transferência e distribuição de recursos viáveis para os municípios, os securitários, o ensino, os aposentados, os trabalhadores, as domésticas e as donas-de-casa.
Repito: essa será a Constituição cidadã, porque recuperará como cidadãos milhões de brasileiros, vítimas da pior das discriminações: a miséria.
Cidadão é o usuário de bens e serviços do desenvolvimento. Isso hoje não acontece com milhões de brasileiros, segregados nos guetos da perseguição social.
Esta Constituição, o povo brasileiro me autoriza a proclamá-la, não ficará como bela estátua inacabada, mutilada ou profanada.
O povo nos mandou aqui para fazê-la, não para ter medo.
Viva a Constituição de 1988!
Viva a vida que ela vai defender e semear!
Brasília, 27 de julho de 1988
Constituinte Ulysses GuimarãesPresidente da Assembléia Nacional Constituinte
*Discurso pronunciado pelo Presidente Ulysses Guimarães, na Sessão da Assembléia Nacional Constituinte, em 27 de julho de 1988
Ulysses Guimarães4 de março de 1985
Foi longa a travessia de dezoito meses.
Cerca de 5.400.000 pessoas livremente ingressaram no edifício do Congresso Nacional. Quem leva, sem discriminação, contribuição ou crítica a fazer, pode ou pôde, tempestivamente, fazê-lo. As portas estavam e continuam abertas. É só transpô-las.
A Constituinte teve o foro de multidões.
Saúdo o relator Bernardo Cabral, que confirmou seu renome de jurista e sua espartana dedicação, coadjuvado pelos relatores adjuntos Konder Reis, José Fogaça e Adolfo Oliveira, também dignos de reconhecidos encômios, bem como os eficientes membros da mesa.
Sem a compreensão e o talento dos líderes partidários não chegaríamos à fase atual de nossos trabalhos. Os funcionários, representados pelo Secretário-Geral da Mesa, Dr. Paulo Affonso Martins de Oliveira, e pelo Diretor-Geral, Dr. Adelmar Silveira Sabino, bem como a imprensa, rádio e televisão com justiça integrarão este evento histórico.
O Projeto submetido a segundo turno é longo - 321 artigos - versando matéria complexa e tantas vezes controvertida.
Inevitavelmente abriga imperfeições, previstas pela instituição de um segundo turno revisionista e pelo avultado número de emendas e destaques apresentados.
Existem imprecisões, reconheço. Vamos corrigi-las, estou certo.
Mas, mesmo na fase atual, o projeto tem muito mais do que nos orgulharmos do que nos arrependermos. Impõe-se mais defendê-lo do que reformá-lo.
Assinale-se sua coragem em inovar, a começar pela arquitetura original de sua confecção, rompendo padrões valetudinários e enfrentando a rotina do "status quo".
Dissemos NÃO ao stablishment, encarnado no velho do restelo, conclamando, na praia alvoroçada da partida, Vasco da Gama, Pedro Álvares Cabral e Camões a permanecerem em casa, saboreando bacalhau e caldo verde, ao invés da aventura das Índias, do Brasil e dos Lusíadas, e amaldiçoando "O Primeiro que, no mundo, nas ondas velas quis em seco lenho".
Esta constituição terá cheiro de amanhã, não de mofo.
Para não me alongar, reporto-me a alguns aspectos, que reputo inaugurais, do texto ora submetido ao crivo da revisão constituinte.
A soberania popular, sem intermediação, poderá decidir seus destinos. Os cidadãos apresentarão proposta de lei, portanto terão a iniciativa congressual, e também poderão rejeitar projetos aprovados pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal. Portanto, os cidadãos propõem e vetam. São legisladores, exercitam a democracia direta.
Poucas constituições no mundo democrático têm essa presença direta e atuante da sociedade na elaboração dos preceitos de império em seu ordenamento jurídico. O Brasil será, assim, uma república representativa e participativa. Teremos a convivência e a fiscalização de mandante e mandatários a serviço da sociedade.
Após quase 500 anos, o Projeto redime a geografia do Brasil.
Nossa geografia é violentada pela concentração nacional de rendas e de competência. Nossa geografia é regional, é local, é municipal, com municípios maiores do que muitos países.
As urnas dão votos para os governadores e prefeitos administrarem. Mas só a autêntica Federação, que estamos organizando, dá o dinheiro para que tais governos dêem respostas às necessidades localizadas.
Federação é governo junto com o homem. Não homem correndo atrás do Governo Estadual ou de Brasília, freqüentemente longínquo e indiferente.
Esta alforria, do homem e de seus governantes, foi decretada pela transferência de 47% dos recursos da União para os Estados e Municípios, 21,05% àqueles e 22,5% para estes.
Se não tivéssemos feito mais nada, só com isso teríamos feito muito.
Cooperamos para reversão da instável e irracional pirâmide social brasileira de 130 milhões de brasileiros carentes na base projetada para o ar e apoiada em seu vértice em Brasília, onde estão os recursos.
Com os hodiernos conceitos de seguridade, estamos, entre os este países que a adotam, instituindo a universalidade dos beneficiários, mesmo aos que comprovadamente não possam contribuir. Desobstruiu-se o acesso à Previdência, sem desequilíbrio, às donas-de-casa, arrendatários e pescadores.
Diminuiu-se pela equivalência a separação entre o trabalhador rural, com oito benefícios, e o urbano, com trinta e dois.
Governar é encurtar distâncias. Governar é administrar pressões, e as pressões primárias e diretas são as do lugar onde se vive, trabalha, estuda, sofre e ama.
Quanto aos onze milhões de aposentados, foi-lhes garantido o valor real dos proventos através do tempo, para que não sejam destroçados pela inflação, como hoje ocorre, ocasionando a humilhação, o desespero e a morte.
Senhoras e Senhores Constituintes.
A Constituição, com as correções que faremos, será a guardiã da governabilidade.
A governabilidade está no social. A fome, a miséria, a ignorância, a doença inassistida são ingovernáveis.
Governabilidade é abjurar o quanto antes uma carta constitucional amaldiçoada pela democracia e jurar uma constituição fruto da democracia e da parceria social.
A injustiça social é a negação e a condenação do governo.
A boca dos constituintes de 1987-1988 soprou o hálito oxigenado da governabilidade pela transferência e distribuição de recursos viáveis para os municípios, os securitários, o ensino, os aposentados, os trabalhadores, as domésticas e as donas-de-casa.
Repito: essa será a Constituição cidadã, porque recuperará como cidadãos milhões de brasileiros, vítimas da pior das discriminações: a miséria.
Cidadão é o usuário de bens e serviços do desenvolvimento. Isso hoje não acontece com milhões de brasileiros, segregados nos guetos da perseguição social.
Esta Constituição, o povo brasileiro me autoriza a proclamá-la, não ficará como bela estátua inacabada, mutilada ou profanada.
O povo nos mandou aqui para fazê-la, não para ter medo.
Viva a Constituição de 1988!
Viva a vida que ela vai defender e semear!
Brasília, 27 de julho de 1988
Constituinte Ulysses GuimarãesPresidente da Assembléia Nacional Constituinte
*Discurso pronunciado pelo Presidente Ulysses Guimarães, na Sessão da Assembléia Nacional Constituinte, em 27 de julho de 1988
Ulysses Guimarães4 de março de 1985
Um comentário:
Sim, provavelmente por isso e
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